Quantas de nós já precisamos lidar com uma situação parecida? Sua menina de três aninhos é mordida na escola, ou volta da classe de EBD com o bracinho vermelho: ela foi empurrada pelo coleguinha. A primeira reação que uma mãe tem é de acolher e consolar sua pequena. A segunda é querer saber quem fez aquilo, ansiando por justiça! Às vezes, inclusive, a ordem dos sentimentos é alterada. Quem teria a coragem de maltratar minha bebê tão dócil e frágil? Essa criança não tem mãe? Onde estava a professora que não viu isso acontecer? Todas estas e muitas outras perguntas e indagações se aninham no coração da mãe ao ver seu filho injustamente machucado.
“Quer comais quer bebais ou façais qualquer outra coisa…”
Como somos alertadas pela Palavra de Deus, todos os nossos pensamentos, desejos, sentimentos e ações devem ser voltadas para a Sua glória! E você acha que isso se refere apenas a coisas “espirituais”? Não! O próprio texto citado acima usa como exemplo os gestos mais básicos do nosso dia- a- dia: comer e beber! Nas atitudes mais cotidianas precisamos buscar a glória de Deus, nos perguntar como podemos dar testemunho da nossa fé e sermos sal e luzeiro deste mundo. Não precisamos esperar grandes e memoráveis situações para agirmos assim. Não devemos achar que provar a nossa fé é um ato reservado apenas para momentos de grandes provações, em que teremos que sofrer pelo Evangelho e talvez, um dia, darmos nossa vida por ele. Podemos ir treinando nas pequenas situações da vida, onde SIM, também nos é exigida uma vida de santidade e provas da nossa fé. E quer momento melhor para refletir a luz do Evangelho do que quando seu filho é agredido? Tantas coisas estão em jogo, tantos pecados vêm à tona num acontecimento tão cotidiano quanto este, que podemos nos assustar!
Em primeiro lugar, devemos analisar o nosso próprio coração. Talvez ele esteja permeado por idolatria e sequer saibamos. Identificaremos a idolatria em nós mesmas, no momento em que pecarmos porque pecaram contra os nossos! Se a nossa primeira atitude é uma atitude de ira, autocomiseração e justiça própria (“que vontade de esganar aquele moleque!”), já temos aí um ídolo erigido contra o qual precisamos lutar: o bem estar de nossos filhos a qualquer custo. Não entender que pecar contra Deus porque pecaram contra nossos pequenos é idolatria, é um sério risco que corremos.
Nossos filhos são pecadores também, lembra? E como pecadores estão inseridos num mundo de pecado, cheio de outros pecadores. Isto significa que nossos pequenos estão expostos a todo tipo de desgraça que o pecado trouxe sobre a humanidade: morte, doenças (algumas muito graves), inimizades, agressões, injustiças. Você acha mesmo que conseguirá proteger seu filho das adversidades a que estão expostos? Lembre-se que ele nasceu num mundo contaminado pela praga do pecado. Será que temos exagerado na busca da proteção deles? Será que temos tanto medo de que algo ruim aconteça com eles que estamos dispostas até mesmo a pecar para manter o status de “são e salvo” de nosso filho? Estas perguntas merecem um profundo questionamento a nós mesmas!
Não estou querendo dizer, entretanto, que você não deva cuidar ou proteger seus filhos de perigos e dores. Não é esse o ponto. Você DEVE protegê-lo, foi chamada para isso! Se seu filho foi agredido na escola, por exemplo, procure a professora e converse com ela, evite deixar seu filho brincar com aquela criança que você sabe que é agressiva, troque-o de turma se for o caso. É lícito tomarmos atitudes para tirarmos nossos pequenos de situações que podem provocar dor a ele. Mas a questão que gostaria que você analisasse é a do coração. Como lidar com acontecimentos que você não foi capaz de evitar, é o assunto deste artigo!
Convivemos com uma natureza caída: a nossa, a do nosso filho e a do coleguinha!
Esta é a primeira coisa que devemos ter em mente quando nos deparamos com uma bochecha mordida! Nosso filho é pecador, e isso quer dizer que ele pode ter provocado a situação que culminou em agressão. Mas se ele é totalmente inocente neste episódio, lembre-se que não é inocente em todos! Em algum momento seu filho também já foi (ou com certeza ainda será), o agente que causou dor física ou emocional em outra criança. Algumas delas não são de bater, mas são mestres em levar outras crianças ao extremo da ira!
Certa vez presenciei uma situação que ilustra bem o que estou querendo dizer. A filha de uma amiga minha, de três anos, foi convidada para uma festinha infantil. A festa era linda e a aniversariante, vestida de princesa, sussurrava ao ouvido da amiguinha: “essa festa não é sua, é minha! Você nem tem um vestido de princesa como o meu… essa festa é MINHA, não é sua”. A filha da minha amiga, que é uma pimenta, ouviu a primeira e a segunda provocação. Na terceira, já aos prantos (afinal a festa não era dela e ela não tinha um vestido de princesa!!), deu um empurrão na aniversariante que se pôs a chorar inconsolável. Pense na situação! Ninguém exceto eu, que estava bem ao lado, havia visto a cena toda. Para todos os efeito, a filha da minha amiga deu um empurrão na pobre e doce princesa! Ninguém havia visto os requintes de maldade e o prazer da pequena ao dizer à colega que ela não era a dona da festa. Percebe como nem sempre temos todos os dados para fazer um julgamento correto? A filha da minha amiga estava errada e pecou por se irar e empurrar a menina. Esta por sua vez, pecou ao sentir prazer em menosprezar a criança que não era a estrela da noite! Ambas precisavam ser corrigidas e admoestadas a abandonar seus pecados. Apenas pais muito atentos e preocupados serão capazes de perceber estas nuances e agir de modo sábio e bíblico, não sendo uma “Alice no país das maravilhas” achando que seu filho nunca tem culpa de nada e é sempre vítima de alguém.
Mas e se, de fato, meu filho for a vítima?
Eu sei bem como é a situação de uma criança que agride outra de graça, sem ter acontecido absolutamente nada que gerasse a agressão. Para meu desespero, meus dois filhos mais velhos passaram pela terrível fase de morder, e quando o faziam, era apenas porque tinham vontade e não porque eram provocados! É fato que situações assim acontecem, e como você deve reagir quando seu filho foi agredido sem ter culpa no cartório? Será que, aí sim, te é permitido dar largas à sua ira e agir com justiça própria? Antes de tratarmos do coração do nosso filho que sofreu a injúria, precisamos tratar do nosso! Como eu encaro os sofrimentos neste mundo, como eu me vejo diante de Deus, com quantas armas defendo os meus direitos em detrimento do que a Bíblia fala, são conceitos que farão toda a diferença no meu modo de agir. Não se engane minha irmã, tudo que você aprende com as pregações de seu pastor, com o que você lê na Bíblia e em outros livros cristãos, todo o corpo de doutrinas que você tem aprendido, precisam ser usados nas situações mais corriqueiras de sua vida. Para isso serve a Palavra de Deus. A Bíblia não é formada por conhecimentos intangíveis, que não têm nada a ver com a minha vida diária! Todas as grandes doutrinas do Evangelho devem ser postas em prática na nossa vida, devem pautar a maneira que encaro o mundo a minha volta, devem ser a minha regra de viver diário! Não podemos separar as grandes doutrinas do Evangelho do beliscão que meu filho levou na escola. Precisamos fazer estas conexões o tempo todo. E mais: precisamos ensinar estas grandes verdades, aplicadas ao cotidiano, aos nossos pequenos. Se não for assim, alguma hora ele desejará deixar de lado estes ensinamentos tão bonitos, mas que não têm aplicação nenhuma em sua vida. O Evangelho é vida! Tiago nos ensina isso de forma taxativa: “Meus irmãos, qual é o proveito, se alguém disser que tem fé, mas não tiver obras? Pode, acaso, semelhante fé salvá-lo?” Tiago 2.14. A prática das boas obras testificam a nossa fé! Uma vida de prática daquilo que a Bíblia ensina, demonstra ao mundo de forma gritante em que nós cremos.
Dito isso, pergunto a você: por que muitas vezes, ao verem seus filhos serem agredido, os pais fomentam a ira em seus próprios corações e nos corações de seus filhos? Por que os pais não optam por perdoar e ajudar os pais que estão tendo dificuldade com seus filhos? Por que adultos preferem ensinar as crianças a revidar os ataques sofridos? Por que se recusam a obedecer ao Evangelho neste quesito específico?
Ensiná-los a sofrer injúrias, sofrer o dano.
Em I Coríntios 6, Paulo trata de contendas e litígios entre irmãos e diz que só haver estas contendas, já era completa derrota para eles. Ir a um tribunal de ímpios, para que fosse julgada uma causa entre irmãos, então… seria vergonhoso. No final desta advertência ele diz que entre levar a causa a tribunais injustos e ficar no prejuízo, os crentes deveriam optar pela segunda alternativa: “Por que não sofreis, antes, a injustiça? Por que não sofreis, antes, o dano?” (verso 6). Paulo não está ensinando neste texto que não podemos ir à justiça, pleitear nossos direitos. A questão é quando fazer isso traz dano ao Evangelho. Se fazer sobressair a sua causa justa, for em alguma medida prejuízo ao Evangelho, você deve optar por sofrer o dano!
Na sociedade que vivemos hoje, a palavra de ordem é: “meus direitos!”. Estamos dispostos a tudo para fazer valer nossos direitos. Ficar no prejuízo, sair perdendo, ser lesado, ficar com a pior parte é simplesmente impensável. Ser agredido e não revidar, ser ferido e não pagar na mesma moeda? Nunca! Somos ensinados por este século a nos estimar a tal ponto, que somos capazes inclusive de pecar para defender a nossa honra e os nossos direitos. Mas Jesus agiu de forma completamente diferente. Ele é o nosso modelo, a Ele devemos imitar e seguir!
Se você pretende que seu filho seja um seguidor do Evangelho de Cristo, que seja um crente fiel às Escrituras, comece plantando desde cedo em seu coração os grandes princípios nela contidos! Ensine-o a sofrer pelo Evangelho. Ele será escarnecido e zombado na escola por seu honesto e diferente procedimento. Ensine-o a não se importar com o que os outros pensam dele, mas com o que Deus pensa a seu respeito. Ensine-o a não dar valor demais à aceitação que ele pode ou não ter dos amiguinhos, isto não o tornará melhor. Seu valor não está na popularidade que alcança na escola, mas em ser um filho obediente e temente ao seu Deus. Incentive-o a perdoar e a buscar reconciliação, mesmo quando o causador da contenda não for ele.
Ajude-o também a orar pela criança que o agrediu. Não é assim que a Bíblia ensina? “…amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem; para que vos torneis filhos do vosso Pai celeste, porque ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos. Porque, se amardes os que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem os publicanos também o mesmo? E, se saudardes somente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os gentios também o mesmo? Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste” Mateus 5.44-48. O que me espanta é porque pais crentes ensinam seus filhos a revidar e a detestar o coleguinha que os feriu, para mais tarde ensiná-los a dar a outra fase, a não revidar as ofensas. O que os faz pensar que a Lei de Deus é uma para os pequenos pecadores e outra para os pecadores já crescidos? Onde a Bíblia nos autoriza a ensinarmos nossos filhos a revidar ofensas, a detestar? Deveríamos ensinar a nossos filhos que dias piores virão, dias em que talvez eles tenham que dar a vida por amor ao Evangelho como fez Estevão, Pedro, João Batista e tantos outros mártires que pagaram um alto preço por sua fé. Começar por ensinar que o mundo não gira em torno deles e que sofrer uma agressão injusta não é a pior coisa que pode acontecer a alguém, é um bom começo para prepará-los para os sofrimentos que a vida de um crente fiel pode trazer.
Reafirmo o que disse acima: você pode e deve proteger seu pequeno de crianças que o maltratam, mas COMO você fará isso é a questão. Como você pastoreará o coração de seu filho quanto ao que aconteceu fará uma grande diferença para seu futuro! Será que numa situação destas você agiganta os sentimentos dele de auto-piedade, do quanto ele é bonzinho e o colega mau? Será que você tem nutrido no coração de seu filho sentimentos de amargura e vingança contra aquela criança? Ou ao contrário, tem procurado minimizar o acontecido, explicando a seu filho que ele ainda enfrentará muitas situações parecidas? Será que você tem incentivado-o a orar pelo coleguinha e a buscar reconciliação, quando possível? Será que você tem auxiliado-o a lutar contra a sensação de que ele só será feliz se todos o tratarem muito bem, e se ele for amado por absolutamente todos a sua volta? Você tem ensinado seu filho a lidar de forma santa com a rejeição?
Treine-o a pensar e a viver de acordo com as Escrituras desde a tenra idade! Ensine-o a colocar em prática desde muito cedo as grandes e poderosas verdades do Evangelho, ensine-o a viver por meio d'Ele! Desta forma você estará treinado-o para ser um valoroso servo de Deus, que pauta tudo o que faz, sente e pensa pela única regra de fé e de prática que nos revela quem Deus é e o que exige de seus filhos: A sua santa Palavra!
- por Simone Quaresma