Contudo, nesta obra, como em todas as outras, tive tentações de vários tipos. Às vezes, em meu trabalho, eu era atacado com grande desânimo, medo de não ser capaz de pronunciar uma única palavra de edificação ou até de não conseguir falar qualquer coisa que tivesse sentido para as pessoas. Nessas ocasiões, uma estranha debilidade e falta de vigor sobrevinha ao meu corpo, de modo que minhas pernas mal podiam carregar-me ao lugar onde tinha de falar.
Em outras ocasiões, enquanto estava pregando, era violentamente assaltado por pensamentos blasfemos e fortemente tentado a expressar esses pensamentos em voz alta, na presença da congregação. Algumas vezes, mesmo quando começava a pregar a Palavra com bastante clareza, com testemunho fiel e liberdade de discurso, antes que chegasse ao fim, eu ficava tão desconcertado e desviado das coisas sobre as quais estava falando, e minha locução, tão obstruída, que eu parecia não saber nem lembrar o que estava fazendo ou parecia que minha cabeça estivera numa sacola todo o tempo em que preguei.
Às vezes, quando eu estava para pregar sobre alguma passagem penetrante e desafiante da Palavra, o tentador sugeria: "O quê?" Você vai pregar isso? Isso te condena; sua própria alma é culpada disso, não pregue sobre isso de jeito nenhum, ou, se o fizer, interprete e aplique o texto de maneira que lhe permita escapar, a fim de que, em vez de despertar outros, você não coloque tanta culpa sobre sua própria alma, de forma que nunca possa se recuperar". Mas, graças ao Senhor, fui guardado de consentir com tão horrendas sugestões e, à semelhança de Sansão, tenho me inclinado com toda a minha força a condenar a transgressão e o pecado onde quer que os encontre, mesmo que, ao fazê-lo, traga, de fato, culpa sobre minha consciência. Morra eu, pensei, como os filisteus (Jz 16.30), ao invés de lidar de um modo corrupto com a bendita Palavra de Deus. "Tu, pois, que ensinas a outrem, não te ensinas a ti mesmo?" É melhor trazer juízo sobre si mesmo, pregando plena e fielmente a outros, do que deter a verdade pela injustiça, a fim de proteger-se do poder condenador da Palavra. Bendito seja Deus por seu socorro também aqui!
Ao realizar eta bendita obra de Cristo, também era frequentemente tentado ao orgulho e à altivez de coração. E, embora não ouse dizer que não fui afetado por estas coisas, o Senhor, em sua preciosa misericórdia, lidou comigo de tal modo que, na maioria das vezes, tive apenas o mais tênue desejo de ceder a essas coisas. A cada dia meu quinhão tem sido o de ser exposto à maldade de meu próprio coação e ser capacitado a ver uma multidão de corrupção e fraquezas que há nele. Isso me tem feito curvar a cabeça de vergonha, diante de todos os meus dons e de tudo que tenho alcançado. Tenho sentido esse espinho na carne, até a misericórdia de Deus para comigo (2 Co 12.89).
por John Bunyan (1628-1688)
Fonte: Graça Abundante ao Principal dos Pecadores (autobiografia do autor), págs. 138-139.
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