Sermão pregado dia 12.02.2012
Assim como vimos que grandiosa bênção foi para a igreja, que ao longo do tempo salmodiou exclusivamente, hoje também importa-nos verificar alguns testemunhos acerca do que grandes homens de Deus falaram sobre os instrumentos musicais dentro do culto público.
Assim como pontuamos semana passada, é preciso que sempre lembremos que o Senhor nunca condenou o uso de instrumentos como sendo "feitura de Satanás". Em momento algum estamos advogando que instrumentos são coisas que levam à perdição ou que não são lícitos aos crentes. Contudo, assim como temos visto a diferença entre o culto particular e público, nos é mister atentar que nem todas as coisas que são lícitas em determinado momento, o assim são em outros.
O problema de se usar instrumentos não está no instrumento em si (pois que vida possui?), mas no que ele representava ao povo judeu. Quer dizer, vimos que o Antigo Testamento é recheado do uso de instrumentos, contudo, quando ligado à adoração, diz respeito à lei cerimonial, que segundo vimos, não foi abolida, e sim modificada, dada uma roupagem nova e teve seu ápice e fim em Cristo Jesus. Quer dizer, se as vestes sacerdotais agora estão no andar diário do crente, se o incenso é nossa oração, se o sacrifício de animais foi findado em Jesus, se os sacrifícios pessoais agora são diários (em nosso viver), também entendemos que os instrumentos agora são anulados para dar lugar a algo melhor, isto é, a própria voz dos crentes. Visto também que o Novo Testamento é totalmente silencioso quanto à essa questão, importa-nos não avançar no revelado pelas Escrituras, pois conforme já explicitado (clique aqui), não nos pautamos pelo princípio normativo, e sim pelo regulador.
Vejamos alguns testemunhos da igreja:
MÁRTIR, sobre a Lei Cerimonial como "rudimentos do mundo", escrito no século II, por volta do ano 150 d.C.: "O simplesmente cantar não agrada crianças (os judeus), mas o cantar acompanhados de instrumentos sem vida artificiais, de danças e de bater de palmas, lhes agrada muito. Por isto, o uso deste tipo de instrumentos artificiais e de outras coisas agradáveis a crianças foi removido das músicas das igrejas, e ficamos com o puro e singelo cantar a capela"."O uso de música não foi recebido nas igrejas cristãs da maneira que ela era entre os judeus, no estado infantil deles, mas somente foi aceito pelas igrejas o uso do puro e desadornado cantar com os puros lábios, a capela." [1]
CLEMENTE, século II, explicando a excelência dos Salmos de Davi e a relação destes com o Novo Testamento: "Ademais, Rei Davi, o Harpista de quem falamos acima, nos incitou à verdade e para longe dos ídolos. Tão distante estava Davi de cantar os louvores de demônios, que estes foram postos em fuga por ele, com a verdadeira música; e quando Saul estava possesso, Davi o curou meramente por tocar a harpa não é dito que Davi cantou! Em contraste O Senhor como supremo artífice formou no homem o mais lindo instrumento, que respira com vida, criado à Sua própria imagem. Seguramente Ele mesmo o Cristo é um instrumento de Deus, totalmente harmônico, melodioso e santo, a sabedoria acima deste mundo, a Palavra celestial"... "Aquele que brotou de Davi e todavia era antes dele, o Verbo de Deus, zombou e desprezou a lira e a cítara, aqueles instrumentos sem vida. Pelo poder do Espírito Santo, Ele dispôs em harmoniosa ordem este grande mundo e, sim, o pequeno mundo do homem também, corpo e alma juntos; e nestes instrumentos de muitas vozes do universo, Ele o Cristo faz música para Deus, e canta com o acompanhamento do instrumento humano, 'Porque vós sois minha harpa e meu órgão de flautas e meu templo.' isto é uma aplicação de 2Co 6.16." [2]
EUSÉBIO: (admirável historiador, chamado "O Pai da História da Igreja"): "Antigamente, no tempo em que aqueles da circuncisão estavam adorando com símbolos e tipos, não era inapropriado elevar hinos a Deus acompanhados com o saltério e a cítara, e fazê-lo nos dias de sábado... Hoje, porém nós os cristãos oferecemos nossos hinos com um saltério vivo e uma cítara viva, e com cânticos espirituais. As vozes dos cristãos, em uníssono, são mais aceitáveis a Deus do que qualquer instrumento musical. É de acordo com isto que, em TODAS as igrejas de Deus, unidas em alma e atitude, com um só pensar e em concordância de fé e piedade, nós enviamos ao céu uma melodia em uníssono, com as PALAVRAS dos Salmos sem instrumentos." (Eusébio, 260-340 DC). [3]
AGOSTINHO de Hipona, século IV: "... instrumentos musicais não eram usados. A gaita, o tamborim, e a harpa são aqui neste mundo tão intimamente associados com os sensuais cultos pagãos, como também com as orgias desenfreadas e com as performances imorais dos circos e teatros, que é fácil entender os justificados entendimentos contra o uso destes instrumentos na adoração." [4]
CRISÓSTOMO, século IV, expondo os Salmos em relação ao Novo Testamento: "Davi antigamente cantava canções, hoje nós também cantamos hinos. Ele tinha uma lira com cordas sem vida, a igreja tem uma lira com cordas vivas. Nossas línguas são as cordas da lira, tendo um som realmente diferente, mas muito mais de acordo com a devoção. Aqui não há necessidade de cítara, ou de cordas esticadas, ou de plectro [Instrumento que servia para fazer vibrar as cordas da lira.], palhetinha de ouro ou marfim, para tanger cordas, ou de arte, ou de nenhum instrumento; mas, se você quiser, você mesmo pode se tornar uma cítara, mortificando os membros da carne e fazendo uma completa harmonia entre a mente e o corpo. Porque, quando a carne não mais cobiça contra o Espírito, mas tem se submetido às suas ordens e tem sido profundamente levada no caminho melhor e mais admirável, então você criará uma melodia espiritual." [5]
LUTERO, Reformador século XVI: "O órgão na adoração é a insígnia o emblema simbólico de Baal. ... Os Católicos Romanos o tomaram emprestado dos judeus.... Se pudéramos, removeríamos todos.” [6]
CALVINO, Reformador do século XVI: "Instrumentos musicais celebrando os louvores a Deus são tão adequados quanto o queimar de incenso, o acender de candeeiros, e a restauração de outras sombras das cerimônias da Lei. Os Papistas, portanto, têm imbecilmente tomado isto emprestado, como também muitas outras coisas, dos judeus. Homens que são afeiçoados à pompa externa podem se deleitar naquela barulheira; mas a simplicidade que Deus nos recomenda pelos apóstolos é muito mais agradável a Ele. Paulo nos permite abençoar Deus na reunião pública dos santos, somente em uma língua conhecida (1Co 14:16). Que iremos então dizer do canto de coros que enche os ouvidos com nada mais que um som vazio porque é atrapalhado pela zoeira dos instrumentos?" [7]
SPURGEON, Batista Reformado do século XIX: "Louvai ao Senhor com a harpa. Israel estava na escola primária e usava coisas infantis para ajudá-la a aprender; mas nestes dias quando Jesus nos dá sólido e maduro alimento espiritual, pode-se fazer melodia sem instrumentos mesmo os de corda e de sopro. Não temos necessidade deles. Eles impediriam ao invés de ajudar nosso louvor. Cantai a Ele. Esta é a mais doce e melhor música. Nenhum instrumento é como a voz humana." (Comentário sobre Salmo 42:4). "Davi parece ter tido uma recordação particularmente terna do cantar simples dos peregrinos, e seguramente esta é a mais deliciosa parte da adoração e que chega mais próximo da adoração no céu. Que degradação suplantar o cantar inteligível de toda a congregação pela beleza teatral de um quarteto... Tanto podemos inutilmente orar mecanicamente como inutilmente louvar por maquinários instrumentos e equipamentos." 1Co 14:15 "Que farei, pois? Orarei com o espírito, mas também orarei com o entendimento; cantarei com o espírito, mas também cantarei com o entendimento", portanto eu estou tão disposto a orar a Deus através de máquinas e instrumentos quanto a cantar a Deus com máquinas e instrumentos." [8]
AQUINO: "Nossa igreja [isto é, o cristianismo, desde sua origem até este nosso século XIII] de modo algum usa instrumentos musicais (tais como harpas e saltérios) para louvar a Deus, para que não pareça [ou ocorra] que ela judaízou-se." [9]
LEICHTENTRITT: "No entanto, na Igreja Cristã inicial, só o cantar era permitido, não o tocar de instrumentos." [10]
NAUMAN: "Não pode haver nenhuma dúvida de que, originalmente, em todos os locais, a música do culto a Deus foi inteiramente de natureza vocal." [11]
RITTER: "Não temos conhecimento real do caráter exato da música que formava uma parte da devoção religiosa das primeiras congregações cristãs. No entanto, [sabemos que] ela foi puramente vocal." [12]
COLEMAN: "Tanto os judeus nos seus cultos no templo, como os gregos em sua adoração aos ídolos, tinham o costume de cantar com o acompanhamento de instrumentos musicais. Os convertidos ao cristianismo têm que ter sido familiares com este modo de cantar ... Mas é geralmente admitido que os primeiros cristãos não empregavam nenhum instrumento musical nos seus cultos." [13]
ROMA: "... os primeiros crentes eram de uma fibra demasiadamente espiritual para substituírem a voz humana por instrumentos sem vida, ou [mesmo] para usar [aqueles instrumentos] como acompanhantes [da voz humana]." [14]
CAVARNOS: "Na igreja bizantina, a execução de música por instrumentos, ou mesmo o acompanhamento de cânticos sacros por instrumentos, era proibida pelos Pais [os líderes religiosos] do Oriente [as regiões ao redor e incluindo a Grécia], como sendo incompatíveis com o caráter espiritual, solene e puro da religião de Cristo." [15]
Outra informação - já citada na semana anterior, mas vale relembrar - interessante é também trazida por Ashby L. Camp, onde diz: "Esse é o porquê de se cantar sem o acompanhamento musical é chamado de a cappella. 'A cappella vem do latim por meio italiano e quer dizer 'no estilo da igreja', 'como é feito na igreja''. A forma clássica da música na igreja é cantar-se desacompanhado [de instrumentos]". [16] Também o presidente e professor de História da Igreja no Westminster Theological Seminay, nos diz: "Outra característica do louvor antigo que é bastante certo é que a igreja antiga não usava instrumentos musicais durante seus serviços de adoração. Isso vem como uma grande surpresa para a maioria dos cristãos, contudo, as evidências para isso são muito fortes". [17]
Muitos em nossos dias contra argumentam dizendo que esses homens citados combateram o uso de instrumentos por estarem envolvidos e "cheirarem" ao romanismo e toda sorte de superstição, porém esse tiro sai pela culatra, pois em momento algum nos pautamos pelo que o romanismo (ou ainda outro grupo) fez ou deixou de fazer, mas sim pela diferença que vemos entre o culto do Antigo Testamento (recheado de símbolos visíveis) e do Novo Testamento ("nu", desprovido de elementos visíveis - porque a realidade chegou, isto é, Cristo Jesus). Também é importante notar como que os testemunhos (acima) são de ordem piedosa, isto é, os autores não deixam de usar argumentos somente porque é a ordem bíblica - como se seguissem uma mera racionalização -, mas também porque essa ordem os leva à uma maior afeição pela beleza do culto neotestamentário.
Esse entendimento sobre os instrumentos deve nos levar a buscar viver uma vida cada vez mais devota ao Senhor, pois assim como eles são cuidadosamente tocados e afinados (no Antigo Testamento e em outros lugares onde seu uso é lícito) para que possam soar a exata nota pretendida pelo autor da música, de modo muito mais intenso deve estar a nossa vida, onde não somos como o metal que retine (1Co 13.1), e sim instrumentos vivos nas mãos do Deus soberano. Se cuidamos em tocar e afinar os instrumentos conforme o intento original do autor da canção, muito mais excelente deve ser nossa dedicação em louvar ao Senhor como todo o nosso ser - sem instrumentos ou meios que mediem nossa adoração ao Senhor, pois já não estamos mais nas sombras do que haveria de vir, mas na realidade e em Cristo Jesus.
"Tudo quanto tem fôlego louve ao SENHOR. Louvai ao SENHOR" (Sl 150.6).
Amém.
Notas:
[1] Works of William Perkins, vol. 1.[2] Clemente de Alexandria, 185 DC, "Readings" pág. 62.
[3] Eusébio - comentário no livro de salmos, salmo 91.
[4] Agostinho (354 d. C) - descrevendo o cantar na igreja de Alexandria, sob Atanásio.
[5] Crisóstomo homílias nos salmos - salmo 41 - (Crisóstomo, "Exposition of Psalms 41", escrito em 381-398 DC, Source Readings in Music History, ed. O. Strunk, W. W. Norton and Co.: New York, 1950, pg. 70. Crisóstomo viveu em 347-407 DC)
[6] Martinho Lutero, Mcclintock & Strong's Encyclopedia Volume VI, p. 762.
[7] Calvino - comentário nos salmos, salmo 33.
[8] Spurgeon - comentário no salmo 42.
[9] Tomás de Aquino, [1225-1274 d.C.], Bingham's Antiquities, Vol. 3, pág. 137 - citado em Eclesiologia - As Doutrinas das Igrejas dos Salvos do Novo Testamento, por Hélio de Menezes Silva. Disponível AQUI.
[10] Ibid, Hugo, Music, History And Ideas, p. 34.
[11] Ibid, Emil Nauman, The History Of Music, Vol. 1, p. 177.
[12] Ibid, Dr. Frederick Louis Ritter, History Of Music From The Christian Era To The Present Time, p. 28.
[13] Ibid, Lyman Coleman (Presbiteriano), The Apostolic And Primitive Church, pp. 368-369.
[14] Ibid, Catholic Encyclopedia.
[15] Ibid, Constantine Cavarnos [Grego Ortodoxo], Byzantine Sacred Music
[16] CAMP, Ashby L - Music In Christian Worship, pág 5 - tradução livre
[17] GODFREY, W. Robert - citado por Ashby L. Camp, apud, 7.
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