Sermão pregado dia 11.08.2013
Veja a pregação em vídeo, realizada na Igreja Cristã Reformada de Blumenau.
Link: http://www.youtube.com/watch?v=jnsz3pgJ0ig&feature=youtu.be
Veja a pregação em vídeo, realizada na Igreja Cristã Reformada de Blumenau.
Link: http://www.youtube.com/watch?v=jnsz3pgJ0ig&feature=youtu.be
"Por esta causa eu, Paulo, sou o prisioneiro de Jesus Cristo por vós, os gentios" (Ef 3.1).
Tendo estabelecido a doutrina de que era apóstolo pela vontade de Deus (Ef 1.1) e acerca da salvação pela graça dada aos gentios, agora escreve aos irmãos dizendo que isso lhe custou algo caríssimo: sua prisão. O homem que outrora perseguia os cristãos e possuía satisfação ao prendê-los (At 9.21), agora está em cadeiras por causa de sua fé - "Aquele que já nos perseguiu anuncia agora a fé que antes destruía" (Gl 1.23). Que grande mudança!
A vida de um cristão é, à semelhança do que ocorreu com Paulo e os gentios aos quais ele se dirigia, de transformação visível e notária aos homens. Os homens uma vez convertidos, não são transformados simplesmente quanto as suas convicções e filosofias, e sim às atitudes e desdobramentos da vida. Paulo não pôde continuar com suas velhas práticas carnais, pois o evangelho lhe transformou por completo. Os gentios em Éfeso não podiam continuar cultuando a deusa Diana (At 19), pois tinham se despido do velho homem. A palavra do Senhor, uma vez incrustada na vida do homem, ensina a melhor maneira de viver e concede a mais nobre transformação da mente.
No entanto, o apóstolo não se fixa somente na transformação, mas vai além, exultando em Cristo por estar preso. O apóstolo nada reclama sobre sua prisão. Não temos qualquer registro de Paulo murmurando por estar acorrentado e impedido de pregar o evangelho. Pelo contrário, vemos o quanto ele jubilava estar preso pela causa de Cristo e em como isso não era tido como um empecilho para falar de Cristo, pois nestes mesmos lugares ele anunciava o senhorio de Jesus, de modo que muitos, até mesmo do palácio de César, se converteram (Fp 4.22).
Vamos analisar o que aprendemos desta passagem:
1. Há um motivo para todas as coisas
Muitíssimos anos antes já havia escrito o pregador: "Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu" (Ec 3.1). Houve o tempo em que Paulo fora predestinado para perseguir o cristianismo - agora chegara a hora de ser perseguido.
Paulo não fora preso arbitrariamente - que ninguém pense tal coisa. A Escritura nos diz: "O vento assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito" (Jo 3.8). Mas por que assim é? "Porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade" (Fp 2.13). Deus foi quem levou o apóstolo até a prisão, pois anteriormente havia dito sobre ele a Ananias: "eu lhe mostrarei quanto deve padecer pelo meu nome" (At 9.16). O apóstolo foi guiado segundo o conselho da única e perfeita vontade do Soberano, de modo que não sem motivo foi a prisão do santo homem, mas para magnificar a glória do Senhor.
A Escritura nos diz que antes do apóstolo saber o que lhe sucederia, pois ficara cego por três dias (At 9.9), o Senhor já havia determinado um propósito para ele: "este é para mim um vaso escolhido, para levar o meu nome diante dos gentios, e dos reis e dos filhos de Israel" (At 9.15). Talvez a última coisa que Paulo pudesse estar pensando ao ter visto o resplendor da glória de Cristo (At 9.5), era que seria uma testemunha d'Aquele a quem perseguia. No entanto, o Senhor havia, antes da fundação do mundo, escolhido o apóstolo para esse ministério - "Como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo" (Ef 1.4 - grifo meu). O apóstolo não estava em cadeias porque havia desobedecido ao Senhor, e sim o inverso, a saber, porque havia sido chamado por Ele.
Isto nos ensina que o chamado cristão pode envolver duras penas e labutas por esta terra, no entanto, tudo ocorrendo com um precioso propósito, "Até que todos cheguemos à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo" (Ef 4.13).
O Senhor jamais prometeu que os Seus não seriam afligidos por causa do Seu nome - em verdade, asseverou por meio de Jesus: "E de todos sereis odiados por causa do meu nome" (Lc 21.17). E estes "todos" incluiria até mesmo os mais íntimos: "E até pelos pais, e irmãos, e parentes, e amigos sereis entregues; e matarão alguns de vós" (Lc 21.16). "Ide; eis que vos mando como cordeiros ao meio de lobos" (Lc 10.3). Enquanto cristãos neste mundo, somos chamados a viver como àqueles primeiros mártires neotestamentários, que mesmo sob o rugido dos leões e o brandir da espada, permaneciam firmes e inabaláveis. Não fomos enviados como crianças ao parque de diversões, e sim como homens ao cadafalso, para morrermos pelo Senhor.
Somente os nobres podem morrer pelo Rei. Impuros, fracos e débeis não estão aptos para serem os provadores do cálice de reis, a fim de evitar que eles venham a tomar bebida envenenada. É preciso que homens escolhidos sejam dignos de padecerem pelo Rei dos reis. Porém, estes homens, os cristãos, não são dignos por algo intrínseco a eles mesmos, mas em Cristo Jesus são considerados filhos do Altíssimo e por isso são chamados à mesa do banquete, ainda que sejam pobres e fracos por natureza - "Sai depressa pelas ruas e bairros da cidade, e traze aqui os pobres, e aleijados, e mancos e cegos" (Lc 14.21).
Os homens do mundo, aqueles não regenerados, são como o ímpio Hamã que planejava matar o judeu Mardoqueu (Ester 3.5; 7.9). Seguem os passos daquele ímpio e planejam enforcar todos os que dizem seguir o Senhor. Juntamente com este ímpio Hamã, mas sob a égide do Novo Testamento, estava o apóstolo Paulo. Ainda que não desejasse a morte dos judeus por si só, odiava mortalmente todos os que seguiam "o Caminho". Mas ao contrário de Hamã, que foi morto na própria forca que mandara fazer a Mardoqueu (Ester 8.7), Paulo fora liberto e passou a ser um propagador do Reino dos céus.
Oh! Que grande mistério! Em pensar que o Senhor escolheu as coisas loucas deste mundo para serem a glória de Seu reino (1Co 1.27)! Em meditarmos na transformação gloriosa que Deus arquitetou e planejou antes de qualquer coisa ter sido criada, de modo que cada evento ocorrido na terra está sob Sua completa regência e soberania! Em crermos que ovelhas podem sair vivas do meio de lobos terríveis e até mesmo os transformarem por meio de sua mensagem de vida! Que glorioso evangelho é este, que não é limitado por forças naturais e não segue um padrão determinado por homens! Enquanto humanos intentam destruir incessantemente o evangelho, o Senhor preparou todas as coisas de antemão para que glorificassem ao Seu nome!
2. A conversão não anula os efeitos dos pecados passados
Não obstante a glória obtida com sua transformação pelo evangelho, o Senhor haveria de ensinar o apóstolo que a conversão, além de ser uma obra sobrenatural de Deus na vida do homem - pois foi o Senhor quem apareceu a Paulo, e não ele que desejou O ver -, não deixa impune os pecados do passado. Não que Deus se vingue dos pecados em Seus filhos, pois isto já o fez definitivamente na pessoa de Cristo, mas Ele ensina, por meio da disciplina, que haverão dificuldades e tentações a serem superadas durante a vida cristã.
Assim como Paulo teve de enfrentar prisões, perigos de morte, naufrágios e toda sorte de impetuosidades, também os demais cristãos precisam estar cientes de que a salvação não os leva a uma redoma de vida espiritual. Uma vez convertido, o sangue do cristão se torna ainda mais desejável ao inimigo que "anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar" (1Pe 5.8). A figura bíblica para o pecado não é de um homem bondoso ou de alguma criatura mística aparentemente amigável, mas, sim, de um leão faminto, sedento de fome e firmemente determinado a tragar todo aquele a quem puder abocanhar.
Enquanto o homem está envolto às trevas do pecado, Satanás parece não distinguir os seus filhos, pois todos são como lobos, idênticos. Ele olha para a terra e conhece os seus, sabendo quem lhe pertence, mas sem distinguir. Entretanto, uma vez que o evangelho purificador banha com o sangue do cordeiro o outrora lobo, Satanás muito se ira e por isso ordena que todas as suas feras saiam em busca daquele pequeno cordeiro, não medindo forças para o alcançar e não desistindo em quando a vida da ovelha não expirar.
Oh! Que pudéssemos ter essa visão mais forte em nossas vidas! Como viveríamos diferentemente se sustentássemos a correta noção de que somos enviados como ovelhas ao matadouro! Como cordeiros aos lobos! Ainda que poupados pela soberana proteção do Senhor, vivendo e sentido perigos terríveis!
É necessário que entendamos que o viver no mundo é um viver de atalaia: vigilante, ativo e sem demora. E por que precisamos ser vigilantes? Porque ainda sofremos os efeitos do pecado. No entanto, agora estas consequências não são mais um peso, mas uma glória! Assim como as amarras de Paulo não eram um peso, também as dificuldades cristãs devem ser encarados como meios que o Senhor se utiliza para fortalecer os Seus - e "aquele que perseverar até ao fim, esse será salvo" (Mt 10.22).
3. Há uma glória em ser perseguido
Como dissemos, há uma glória em ser perseguido. Esta glória e louvor se estabelecem pelo precioso fundamento: nada pode ser mais nobre do que ser um representante de Deus na terra. A Bíblia nos diz que em Adão todos pecaram, porém, "assim como todos morrem em Adão, assim também todos serão vivificados em Cristo" (1Co 15.22).
Notemos que a transposição do cristão é de morto no pecado para vivo em Cristo (Ef 2.1). Um morto não sofre, não possui sentimentos e não nada tem para reclamar - assim são os não regenerados pelo Senhor. Eles não podem lamentar de coisa alguma, pois nada possuem! Eles não têm qualquer direito de reivindicar melhorias e desejarem que o Senhor lhes seja propício, pois estão mortos! Suas vidas já são uma completa destruição, de maneira que tudo o que julgam sofrer, nada mais é do que sua própria naturalidade! Todavia, aos cristãos é dito que agora foram "vivificados em Cristo". Porque foram feitos nova criatura, agora eles sentem os desprazeres deste mundo. Eles agora odeiam este mundo mal e a recíproca é verdeira, ainda que reconheçam a bondosa mão de Deus os sustentando e ordenando a toda criação. Porque são vivos, podem ter a honra de perecer pelo Senhor.
Notemos como o apóstolo expressa esta glória: "Por esta causa eu, Paulo, sou o prisioneiro de Jesus Cristo". O escolhido do Senhor faz questão de dizer que está preso por causa de Jesus Cristo. Noutras palavras, ele não omite que isto lhe é devido e creditado em sua conta como honra, pois afirma que a causa que o levou ao aprisionamento foi Jesus Cristo. Ainda mais: ele diz ser prisioneiro de Jesus Cristo. Paulo não se reportou aos irmãos em Éfeso como prisioneiro de homens, mas de Cristo Jesus. Adiante ele escreverá novamente, dizendo ser "preso do Senhor" (Ef. 4.1).
Ao olharmos para nossa vida, temos tido a santa atitude do apóstolo em confirmar que somos também como que presos do Senhor? Podemos afirmar que somos "servo[s] de Jesus Cristo" (Rm 1.1)? A palavra que o apóstolo se utiliza para "servo", é a mesma palavra usada para escravo (doulos), levando os crentes a pensarem se uma vez confessando a Jesus como Senhor e Salvador, estavam sendo realmente escravos de Cristo. Em lugar "do jugo da servidão" (Gl 5.1) do pecado, agora os cristãos se encontram sob o jugo de Cristo: "Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve" (Mt 11.30).
Os cristãos são levados pelo jugo, espécie de objeto que ata um boi ao outro pelo pescoço, de maneira que não andem para lugares distintos - isto é o que Cristo usa para dizer aos cristãos. Ele se utiliza de uma expressão belíssima, mostrando como o jugo que Ele coloca, em oposição ao que pecado propõe, é infinitamente mais suave e a carga a ser carregada é leve.
Cristo não nos diz que O seguir é um peso, e sim uma gratidão, uma glória, algo belo, formoso e digno de apreciação? E por quê? "Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna, por Cristo Jesus nosso Senhor" (Rm 6.23).
4. O homem natural nada pode fazer para deter o evangelho
Esta passagem também nos ensina que o homem natural não pode coisa alguma contra a determinação de Deus em fazer com que Sua palavra avance. Ainda que os filhos do Senhor sejam "reputados como ovelhas para o matadouro" (Rm 8.36), somos informados de inabalável certeza que possuía o apóstolo, estando certo "de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, Nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor" (Rm 8.38-39).
Se o homem natural nada pode fazer para barrar o evangelho, isto implica em dizer que coisa alguma nesta vida pode retirar um homem das mãos de Cristo. Ainda que sejamos alertados sobre o pecado imperdoável (Mt 12.31; Mc 3.29; Lc 12.10), ele não será praticado por nenhum dos eleitos do Senhor, pois uma vez que somos instados a confiar no sacrifício substitutivo e imputado eficazmente sobre todos os Seus, tal pecado jamais será praticado pelos genuínos cristãos.
Nem mesmo as cadeias puderam separar o apóstolo do Senhor. Parece-nos que quanto mais o apóstolo sofria, mas digno do evangelho se considerava. Quanto mais padecia na mão de homens iníquos, mais glorificava ao Senhor, pois era cônscio de que homem algum impediria o avançar do evangelho, ainda que o matassem e o esquartejassem.
Os cristãos, "da fraqueza tiraram forças, na batalha se esforçaram" (Hb 11.34). Nas duras perseguições, revela o autor de Hebreus, os santos do Antigo Testamento haviam sido "apedrejados, serrados, tentados, mortos ao fio da espada; andaram vestidos de peles de ovelhas e de cabras, desamparados, aflitos e maltratados (Dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, e montes, e pelas covas e cavernas da terra" (Hb 11.37-38). Mesmo com essa quantidade sem par de sangue cristão derramado, o cristianismo crescia cada vez mais - e assim haverá de ser, até que "encha-se toda a terra da sua glória" (Sl 72.19) e "a minha casa se encha" (Lc 14.23).
5. Anunciar o evangelho poderá custar nossa liberdade
Por fim, mas não de somenos importância, é mister notarmos que o cristianismo, ainda que não necessariamente se suceda em prisões físicas, nos coloca como que em prisões neste mundo. Aqui estamos como que presos pelas correntes dos homens "que detêm a verdade em injustiça" (Rm 1.18). Eles intentam nos aprisionar, limitando o nosso agir e pregar do evangelho. O terrível leão ruge mui perto de nossos ouvidos, nos levando a tremer de pavor. No entanto, não temamos aos homens! "Não temais os que matam o corpo e, depois, não têm mais que fazer. Mas eu vos mostrarei a quem deveis temer; temei aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno; sim, vos digo, a esse temei" (Lc 12.4-5).
O evangelho deve, necessariamente, nos aprisionar neste mundo, fazendo com que sintamos incômodo enquanto vivemos. É verdadeiro o fato de mesmo diante de tantas vicissitudes, o Eterno nos dar uma miríade de graças e misericórdias, concedendo, "o vinho que alegra o coração do homem, e o azeite que faz reluzir o seu rosto, e o pão que fortalece o coração do homem" (Sl 104.15), mas o evangelho precisa ser sentido no mundo - e quando ele for sensivelmente tocado por ele, se insurgirá e tentará nos reprimir.
O cristão não possui nenhuma promessa de que será bem recebido pelos povos da terra, com exceção dos últimos tempos onde o evangelho será maciçamente pregado e aceito pelas nações (Mt 24.14). Não possuímos nenhum estímulo para esperar o louvor dos homens. Possuímos, sim, estímulo para continuar lutando e destruindo as hostes infernais pelo poder do Senhor, "Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas, sim, contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais" (Ef 6.12).
Que nesta manhã, segundo a poderosa e eficaz graça do Senhor, saiamos resolutos em prosseguir na caminhada cristã, não amando o mundo e crendo, que assim como Paulo foi preso e chegou a desesperar pela própria vida, mas por fim compreendeu que suas dificuldades enfrentadas eram para que não confiasse em si mesmo e passasse a confiar totalmente em Cristo, também possa ser em nossas vidas: "Porque não queremos, irmãos, que ignoreis a tribulação que nos sobreveio na Ásia, pois que fomos sobremaneira agravados mais do que podíamos suportar, de modo tal que até da vida desesperamos. Mas já em nós mesmos tínhamos a sentença de morte, para que não confiássemos em nós, mas em Deus, que ressuscita os mortos" (2Co 1.8-9 - grifo meu).
Tendo estabelecido a doutrina de que era apóstolo pela vontade de Deus (Ef 1.1) e acerca da salvação pela graça dada aos gentios, agora escreve aos irmãos dizendo que isso lhe custou algo caríssimo: sua prisão. O homem que outrora perseguia os cristãos e possuía satisfação ao prendê-los (At 9.21), agora está em cadeiras por causa de sua fé - "Aquele que já nos perseguiu anuncia agora a fé que antes destruía" (Gl 1.23). Que grande mudança!
A vida de um cristão é, à semelhança do que ocorreu com Paulo e os gentios aos quais ele se dirigia, de transformação visível e notária aos homens. Os homens uma vez convertidos, não são transformados simplesmente quanto as suas convicções e filosofias, e sim às atitudes e desdobramentos da vida. Paulo não pôde continuar com suas velhas práticas carnais, pois o evangelho lhe transformou por completo. Os gentios em Éfeso não podiam continuar cultuando a deusa Diana (At 19), pois tinham se despido do velho homem. A palavra do Senhor, uma vez incrustada na vida do homem, ensina a melhor maneira de viver e concede a mais nobre transformação da mente.
No entanto, o apóstolo não se fixa somente na transformação, mas vai além, exultando em Cristo por estar preso. O apóstolo nada reclama sobre sua prisão. Não temos qualquer registro de Paulo murmurando por estar acorrentado e impedido de pregar o evangelho. Pelo contrário, vemos o quanto ele jubilava estar preso pela causa de Cristo e em como isso não era tido como um empecilho para falar de Cristo, pois nestes mesmos lugares ele anunciava o senhorio de Jesus, de modo que muitos, até mesmo do palácio de César, se converteram (Fp 4.22).
Vamos analisar o que aprendemos desta passagem:
1. Há um motivo para todas as coisas
Muitíssimos anos antes já havia escrito o pregador: "Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu" (Ec 3.1). Houve o tempo em que Paulo fora predestinado para perseguir o cristianismo - agora chegara a hora de ser perseguido.
Paulo não fora preso arbitrariamente - que ninguém pense tal coisa. A Escritura nos diz: "O vento assopra onde quer, e ouves a sua voz, mas não sabes de onde vem, nem para onde vai; assim é todo aquele que é nascido do Espírito" (Jo 3.8). Mas por que assim é? "Porque Deus é o que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade" (Fp 2.13). Deus foi quem levou o apóstolo até a prisão, pois anteriormente havia dito sobre ele a Ananias: "eu lhe mostrarei quanto deve padecer pelo meu nome" (At 9.16). O apóstolo foi guiado segundo o conselho da única e perfeita vontade do Soberano, de modo que não sem motivo foi a prisão do santo homem, mas para magnificar a glória do Senhor.
A Escritura nos diz que antes do apóstolo saber o que lhe sucederia, pois ficara cego por três dias (At 9.9), o Senhor já havia determinado um propósito para ele: "este é para mim um vaso escolhido, para levar o meu nome diante dos gentios, e dos reis e dos filhos de Israel" (At 9.15). Talvez a última coisa que Paulo pudesse estar pensando ao ter visto o resplendor da glória de Cristo (At 9.5), era que seria uma testemunha d'Aquele a quem perseguia. No entanto, o Senhor havia, antes da fundação do mundo, escolhido o apóstolo para esse ministério - "Como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo" (Ef 1.4 - grifo meu). O apóstolo não estava em cadeias porque havia desobedecido ao Senhor, e sim o inverso, a saber, porque havia sido chamado por Ele.
Isto nos ensina que o chamado cristão pode envolver duras penas e labutas por esta terra, no entanto, tudo ocorrendo com um precioso propósito, "Até que todos cheguemos à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a homem perfeito, à medida da estatura completa de Cristo" (Ef 4.13).
O Senhor jamais prometeu que os Seus não seriam afligidos por causa do Seu nome - em verdade, asseverou por meio de Jesus: "E de todos sereis odiados por causa do meu nome" (Lc 21.17). E estes "todos" incluiria até mesmo os mais íntimos: "E até pelos pais, e irmãos, e parentes, e amigos sereis entregues; e matarão alguns de vós" (Lc 21.16). "Ide; eis que vos mando como cordeiros ao meio de lobos" (Lc 10.3). Enquanto cristãos neste mundo, somos chamados a viver como àqueles primeiros mártires neotestamentários, que mesmo sob o rugido dos leões e o brandir da espada, permaneciam firmes e inabaláveis. Não fomos enviados como crianças ao parque de diversões, e sim como homens ao cadafalso, para morrermos pelo Senhor.
Somente os nobres podem morrer pelo Rei. Impuros, fracos e débeis não estão aptos para serem os provadores do cálice de reis, a fim de evitar que eles venham a tomar bebida envenenada. É preciso que homens escolhidos sejam dignos de padecerem pelo Rei dos reis. Porém, estes homens, os cristãos, não são dignos por algo intrínseco a eles mesmos, mas em Cristo Jesus são considerados filhos do Altíssimo e por isso são chamados à mesa do banquete, ainda que sejam pobres e fracos por natureza - "Sai depressa pelas ruas e bairros da cidade, e traze aqui os pobres, e aleijados, e mancos e cegos" (Lc 14.21).
Os homens do mundo, aqueles não regenerados, são como o ímpio Hamã que planejava matar o judeu Mardoqueu (Ester 3.5; 7.9). Seguem os passos daquele ímpio e planejam enforcar todos os que dizem seguir o Senhor. Juntamente com este ímpio Hamã, mas sob a égide do Novo Testamento, estava o apóstolo Paulo. Ainda que não desejasse a morte dos judeus por si só, odiava mortalmente todos os que seguiam "o Caminho". Mas ao contrário de Hamã, que foi morto na própria forca que mandara fazer a Mardoqueu (Ester 8.7), Paulo fora liberto e passou a ser um propagador do Reino dos céus.
Oh! Que grande mistério! Em pensar que o Senhor escolheu as coisas loucas deste mundo para serem a glória de Seu reino (1Co 1.27)! Em meditarmos na transformação gloriosa que Deus arquitetou e planejou antes de qualquer coisa ter sido criada, de modo que cada evento ocorrido na terra está sob Sua completa regência e soberania! Em crermos que ovelhas podem sair vivas do meio de lobos terríveis e até mesmo os transformarem por meio de sua mensagem de vida! Que glorioso evangelho é este, que não é limitado por forças naturais e não segue um padrão determinado por homens! Enquanto humanos intentam destruir incessantemente o evangelho, o Senhor preparou todas as coisas de antemão para que glorificassem ao Seu nome!
2. A conversão não anula os efeitos dos pecados passados
Não obstante a glória obtida com sua transformação pelo evangelho, o Senhor haveria de ensinar o apóstolo que a conversão, além de ser uma obra sobrenatural de Deus na vida do homem - pois foi o Senhor quem apareceu a Paulo, e não ele que desejou O ver -, não deixa impune os pecados do passado. Não que Deus se vingue dos pecados em Seus filhos, pois isto já o fez definitivamente na pessoa de Cristo, mas Ele ensina, por meio da disciplina, que haverão dificuldades e tentações a serem superadas durante a vida cristã.
Assim como Paulo teve de enfrentar prisões, perigos de morte, naufrágios e toda sorte de impetuosidades, também os demais cristãos precisam estar cientes de que a salvação não os leva a uma redoma de vida espiritual. Uma vez convertido, o sangue do cristão se torna ainda mais desejável ao inimigo que "anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar" (1Pe 5.8). A figura bíblica para o pecado não é de um homem bondoso ou de alguma criatura mística aparentemente amigável, mas, sim, de um leão faminto, sedento de fome e firmemente determinado a tragar todo aquele a quem puder abocanhar.
Enquanto o homem está envolto às trevas do pecado, Satanás parece não distinguir os seus filhos, pois todos são como lobos, idênticos. Ele olha para a terra e conhece os seus, sabendo quem lhe pertence, mas sem distinguir. Entretanto, uma vez que o evangelho purificador banha com o sangue do cordeiro o outrora lobo, Satanás muito se ira e por isso ordena que todas as suas feras saiam em busca daquele pequeno cordeiro, não medindo forças para o alcançar e não desistindo em quando a vida da ovelha não expirar.
Oh! Que pudéssemos ter essa visão mais forte em nossas vidas! Como viveríamos diferentemente se sustentássemos a correta noção de que somos enviados como ovelhas ao matadouro! Como cordeiros aos lobos! Ainda que poupados pela soberana proteção do Senhor, vivendo e sentido perigos terríveis!
É necessário que entendamos que o viver no mundo é um viver de atalaia: vigilante, ativo e sem demora. E por que precisamos ser vigilantes? Porque ainda sofremos os efeitos do pecado. No entanto, agora estas consequências não são mais um peso, mas uma glória! Assim como as amarras de Paulo não eram um peso, também as dificuldades cristãs devem ser encarados como meios que o Senhor se utiliza para fortalecer os Seus - e "aquele que perseverar até ao fim, esse será salvo" (Mt 10.22).
3. Há uma glória em ser perseguido
Como dissemos, há uma glória em ser perseguido. Esta glória e louvor se estabelecem pelo precioso fundamento: nada pode ser mais nobre do que ser um representante de Deus na terra. A Bíblia nos diz que em Adão todos pecaram, porém, "assim como todos morrem em Adão, assim também todos serão vivificados em Cristo" (1Co 15.22).
Notemos que a transposição do cristão é de morto no pecado para vivo em Cristo (Ef 2.1). Um morto não sofre, não possui sentimentos e não nada tem para reclamar - assim são os não regenerados pelo Senhor. Eles não podem lamentar de coisa alguma, pois nada possuem! Eles não têm qualquer direito de reivindicar melhorias e desejarem que o Senhor lhes seja propício, pois estão mortos! Suas vidas já são uma completa destruição, de maneira que tudo o que julgam sofrer, nada mais é do que sua própria naturalidade! Todavia, aos cristãos é dito que agora foram "vivificados em Cristo". Porque foram feitos nova criatura, agora eles sentem os desprazeres deste mundo. Eles agora odeiam este mundo mal e a recíproca é verdeira, ainda que reconheçam a bondosa mão de Deus os sustentando e ordenando a toda criação. Porque são vivos, podem ter a honra de perecer pelo Senhor.
Notemos como o apóstolo expressa esta glória: "Por esta causa eu, Paulo, sou o prisioneiro de Jesus Cristo". O escolhido do Senhor faz questão de dizer que está preso por causa de Jesus Cristo. Noutras palavras, ele não omite que isto lhe é devido e creditado em sua conta como honra, pois afirma que a causa que o levou ao aprisionamento foi Jesus Cristo. Ainda mais: ele diz ser prisioneiro de Jesus Cristo. Paulo não se reportou aos irmãos em Éfeso como prisioneiro de homens, mas de Cristo Jesus. Adiante ele escreverá novamente, dizendo ser "preso do Senhor" (Ef. 4.1).
Ao olharmos para nossa vida, temos tido a santa atitude do apóstolo em confirmar que somos também como que presos do Senhor? Podemos afirmar que somos "servo[s] de Jesus Cristo" (Rm 1.1)? A palavra que o apóstolo se utiliza para "servo", é a mesma palavra usada para escravo (doulos), levando os crentes a pensarem se uma vez confessando a Jesus como Senhor e Salvador, estavam sendo realmente escravos de Cristo. Em lugar "do jugo da servidão" (Gl 5.1) do pecado, agora os cristãos se encontram sob o jugo de Cristo: "Porque o meu jugo é suave e o meu fardo é leve" (Mt 11.30).
Os cristãos são levados pelo jugo, espécie de objeto que ata um boi ao outro pelo pescoço, de maneira que não andem para lugares distintos - isto é o que Cristo usa para dizer aos cristãos. Ele se utiliza de uma expressão belíssima, mostrando como o jugo que Ele coloca, em oposição ao que pecado propõe, é infinitamente mais suave e a carga a ser carregada é leve.
Cristo não nos diz que O seguir é um peso, e sim uma gratidão, uma glória, algo belo, formoso e digno de apreciação? E por quê? "Porque o salário do pecado é a morte, mas o dom gratuito de Deus é a vida eterna, por Cristo Jesus nosso Senhor" (Rm 6.23).
4. O homem natural nada pode fazer para deter o evangelho
Esta passagem também nos ensina que o homem natural não pode coisa alguma contra a determinação de Deus em fazer com que Sua palavra avance. Ainda que os filhos do Senhor sejam "reputados como ovelhas para o matadouro" (Rm 8.36), somos informados de inabalável certeza que possuía o apóstolo, estando certo "de que, nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as potestades, nem o presente, nem o porvir, Nem a altura, nem a profundidade, nem alguma outra criatura nos poderá separar do amor de Deus, que está em Cristo Jesus nosso Senhor" (Rm 8.38-39).
Se o homem natural nada pode fazer para barrar o evangelho, isto implica em dizer que coisa alguma nesta vida pode retirar um homem das mãos de Cristo. Ainda que sejamos alertados sobre o pecado imperdoável (Mt 12.31; Mc 3.29; Lc 12.10), ele não será praticado por nenhum dos eleitos do Senhor, pois uma vez que somos instados a confiar no sacrifício substitutivo e imputado eficazmente sobre todos os Seus, tal pecado jamais será praticado pelos genuínos cristãos.
Nem mesmo as cadeias puderam separar o apóstolo do Senhor. Parece-nos que quanto mais o apóstolo sofria, mas digno do evangelho se considerava. Quanto mais padecia na mão de homens iníquos, mais glorificava ao Senhor, pois era cônscio de que homem algum impediria o avançar do evangelho, ainda que o matassem e o esquartejassem.
Os cristãos, "da fraqueza tiraram forças, na batalha se esforçaram" (Hb 11.34). Nas duras perseguições, revela o autor de Hebreus, os santos do Antigo Testamento haviam sido "apedrejados, serrados, tentados, mortos ao fio da espada; andaram vestidos de peles de ovelhas e de cabras, desamparados, aflitos e maltratados (Dos quais o mundo não era digno), errantes pelos desertos, e montes, e pelas covas e cavernas da terra" (Hb 11.37-38). Mesmo com essa quantidade sem par de sangue cristão derramado, o cristianismo crescia cada vez mais - e assim haverá de ser, até que "encha-se toda a terra da sua glória" (Sl 72.19) e "a minha casa se encha" (Lc 14.23).
5. Anunciar o evangelho poderá custar nossa liberdade
Por fim, mas não de somenos importância, é mister notarmos que o cristianismo, ainda que não necessariamente se suceda em prisões físicas, nos coloca como que em prisões neste mundo. Aqui estamos como que presos pelas correntes dos homens "que detêm a verdade em injustiça" (Rm 1.18). Eles intentam nos aprisionar, limitando o nosso agir e pregar do evangelho. O terrível leão ruge mui perto de nossos ouvidos, nos levando a tremer de pavor. No entanto, não temamos aos homens! "Não temais os que matam o corpo e, depois, não têm mais que fazer. Mas eu vos mostrarei a quem deveis temer; temei aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno; sim, vos digo, a esse temei" (Lc 12.4-5).
O evangelho deve, necessariamente, nos aprisionar neste mundo, fazendo com que sintamos incômodo enquanto vivemos. É verdadeiro o fato de mesmo diante de tantas vicissitudes, o Eterno nos dar uma miríade de graças e misericórdias, concedendo, "o vinho que alegra o coração do homem, e o azeite que faz reluzir o seu rosto, e o pão que fortalece o coração do homem" (Sl 104.15), mas o evangelho precisa ser sentido no mundo - e quando ele for sensivelmente tocado por ele, se insurgirá e tentará nos reprimir.
O cristão não possui nenhuma promessa de que será bem recebido pelos povos da terra, com exceção dos últimos tempos onde o evangelho será maciçamente pregado e aceito pelas nações (Mt 24.14). Não possuímos nenhum estímulo para esperar o louvor dos homens. Possuímos, sim, estímulo para continuar lutando e destruindo as hostes infernais pelo poder do Senhor, "Porque não temos que lutar contra a carne e o sangue, mas, sim, contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais" (Ef 6.12).
Que nesta manhã, segundo a poderosa e eficaz graça do Senhor, saiamos resolutos em prosseguir na caminhada cristã, não amando o mundo e crendo, que assim como Paulo foi preso e chegou a desesperar pela própria vida, mas por fim compreendeu que suas dificuldades enfrentadas eram para que não confiasse em si mesmo e passasse a confiar totalmente em Cristo, também possa ser em nossas vidas: "Porque não queremos, irmãos, que ignoreis a tribulação que nos sobreveio na Ásia, pois que fomos sobremaneira agravados mais do que podíamos suportar, de modo tal que até da vida desesperamos. Mas já em nós mesmos tínhamos a sentença de morte, para que não confiássemos em nós, mas em Deus, que ressuscita os mortos" (2Co 1.8-9 - grifo meu).
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