sábado, 15 de setembro de 2012

Podemos Fazer Imagens de Cristo? John Murray



A  questão da conveniência das representações gráficas do Salvador é uma  tal que merece ser analisada. Há de se assentir que a adoração a Cristo é  central em nossa santa fé, e que o pensar a respeito do Salvador deve,  em qualquer instância, ser acompanhado com a reverência que pertence a  Seu culto. Nós não podemos pensar nEle sem a apreensão da majestade que  Lhe é própria. Se não recebemos em nós o especial senso de sua  majestade, então somos culpados de impiedade e de desonrá-lo.

Deve  ser reconhecido que o único propósito que com propriedade poderia ser  alcançado por uma representação pictórica é o de que ela transmitiria a  nós algum pensamento ou lição que representasse à Cristo, em consonância  com a verdade e capaz de promover adoração. Daí, a pergunta é  inevitável: é uma representação pictórica uma forma legítima de  transmitir a verdade a respeito dEle e de contribuir com a adoração que  esta verdade deve evocar?

Estamos  todos conscientes da influência exercida sobre a mente e o coração  pelas imagens. As imagens são poderosos meios de comunicação. Como elas  são sugestivas para o bem ou para o mal, e tanto o mais quando  acompanhadas do comentário da palavra escrita ou falada! É inútil,  portanto, negar a influência exercida sobre a mente e o coração por uma  imagem de Cristo. E, se tal é legítimo, a influência exercida deveria  ser uma tal que constrangesse ao culto e à adoração. Reclamar qualquer  objetivo menor que este, como se servido por uma imagem do Salvador,  seria contradição ao lugar que Ele deve ocupar no pensamento, afeição e  honra.

O  argumento para a conveniência das imagens de Cristo se baseia no fato  de que Ele era verdadeiramente homem, que tinha um corpo humano, que era  visível em Sua natureza humana para os sentidos físicos, e que uma  imagem nos ajuda a absorver a estupenda realidade da Sua encarnação, em  uma palavra, que Ele foi feito à semelhança dos homens e foi encontrado  em forma de homem.

Nosso  Senhor tinha um corpo verdadeiro. Ele poderia ter sido fotografado. Um  retrato poderia ter sido feito dEle e, se fosse um bom retrato, teria  reproduzido sua imagem.

Sem  dúvida, os discípulos, nos dias de Sua carne, possuíam uma vívida  imagem mental da aparência de Jesus e não poderiam deixar de ter retido  esta recordação até o fim de seus dias. Eles nunca poderiam reter o  pensamento nEle, pensar em  como Ele peregrinou ao seu lado, sem algo daquela imagem mental e não  poderiam tê-la a parte da adoração e do culto. As características em si,  características das quais se lembravam, seriam parte integrante da  concepção que tinham dEle, e das remiscências do que Jesus fora para  eles em sua humilhação e na glória da aparência da sua ressurreição. E  muito mais poderia ser dito a respeito da importância das  características físicas de Jesus para os discípulos.

Ademais,  Jesus também é glorificado no corpo e esse corpo é visível. E também se  tornará visível para nós, na sua vinda gloriosa "aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o esperam para salvação." (Hebreus 9:28).

O  que, então, podemos dizer sobre as imagens de Cristo? Primeiro de tudo,  é preciso dizer que não temos qualquer tipo de dados como base para  fazer uma representação pictórica; não temos descrições de suas  características físicas para que ao menos permitissem ao mais  aperfeiçoado dos artistas fazer um retrato aproximado. Tendo em conta a  profunda influência exercida por uma imagem, especialmente nas mentes  dos jovens, devemos perceber o perigo envolvido em um retrato para o  qual não há nenhuma garantia, um retrato que é criação da pura  imaginação. Tal pode auxiliar a assinalar a tolice de perguntar: qual  seria a reação de um discípulo, que realmente vira ao Senhor nos dias da  sua carne, ante um retrato que seria  obra da imaginação de alguém que  nunca viu o Salvador? Assim facilmente podemos detectar qual seria a sua  repulsa.

Nenhuma  impressão que temos de Jesus deve ser criada sem a adequada informação  revelatória, e cada impressão, cada pensamento, deve evocar o culto.  Assim, uma vez que não possuímos dados reveladores para uma imagem ou  retrato no sentido próprio do termo, estamos impedidos de fazer uma ou  de usar qualquer uma que tenha sido feita.

Em  segundo lugar, as imagens de Cristo são, em princípio, uma violação do  segundo mandamento. Uma imagem de Cristo, se serve a algum propósito  útil, deve evocar algum pensamento ou sentimento a respeito dEle e,  tendo em vista o que Ele é, este pensamento ou sentimento será de  adoração. Não podemos evitar de fazer da imagem um meio de adoração.  Mas, uma vez que os materiais para esse meio de culto não são derivados  da única revelação que possuímos a respeito de Jesus, ou seja, das  Escrituras, o culto por meio de imagens é limitado a uma criação da  mente humana que não tem garantia revelatória. É uma adoração baseada na  vontade humana apenas. O princípio ensinado pelo segundo mandamento é  que devemos adorar a Deus somente nas formas prescritas e autorizadas  por Ele. É um grave pecado cultuar compelido por uma invenção humana, e é  isso que uma imagem do Salvador envolve.

Em  terceiro lugar, o segundo mandamento proíbe curvar-se a uma imagem ou  semelhança de qualquer coisa em cima no céu, ou embaixo na terra, ou que  está na água debaixo da terra. A imagem do Salvador pretende ser uma  representação ou semelhança dEle que está agora no céu ou, pelo menos,  de quando Ele peregrinou na terra. É claramente proibido, portanto,  prostrar-se diante de tal representação ou semelhança. Isso expõe a  iniquidade envolvida na prática de expor representações pictóricas do  Salvador em locais de culto. Quando adoramos ante uma imagem de Nosso  Senhor, quer seja sob a forma de um mural, ou em tela, ou em vitrais,  estamos fazendo o que o segundo mandamento proíbe expressamente. O que  se torna ainda mais evidente se tivermos em mente que a única razão pela  qual uma imagem deveria ser exibida em um lugar é a suposição de que  ela contribuiria para a adoração daquele que é o nosso Senhor. Esta  prática só demonstra como é fácil tornar-se insensível aos mandamentos  de Deus e às incursões da idolatria. Que a Igreja de Cristo esteja  desperta para os expedientes enganosos pelos quais o arqui-inimigo  sempre tenta corromper a adoração do Salvador.

Em  resumo, o que está em jogo nessa questão é o único lugar que Jesus  Cristo como o Deus-homem ocupa em nossa fé e  no culto que prestamos; e o  lugar único que a Escritura ocupa como a única revelação, o único meio  de comunicação, a respeito daquele a quem adoramos como Senhor e  Salvador. A Palavra encarnada e a Palavra escrita são correlativos. Não  ousemos usar outros meios de impressão ou de sentimento, mas os da Sua  instituição e prescrição somente. Cada pensamento e impressão dEle deve  evocar adoração. Nós O adoramos com o Pai e o Espírito Santo, um só  Deus. Usar uma imagem de Cristo como um auxílio para o culto é proibido  pelo segundo mandamento, tanto quanto isto é proibido em relação ao Pai e  ao Espírito.

texto por John Murray
Republicado a partir de Reformed Herald, Fevereiro 1961

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